DCC RPG, um jogo que usa o passado para a diversão como nenhum outro

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Já falei que fiquei muito tempo parado, sem jogar RPG de mesa. Bem, depois de um tempo com o Dungeon World, decidi jogar outro sistema que me cativou, por resenhas na internet: Dungeon Crawl Classics. Porém, antes de falar sobre este jogo magnífico, devo explicar o que seria o movimento OSR, por mais difícil que isso seja.

Vejam, este movimento tem várias definições, defensores, detratores e pontos de vista. Logo, uma explicação mais complexa demanda sua própria postagem, irei aqui descrever o que eu entendo por OSR.

OSR é a sigla para Old School Renaissance, movimento este que trás de volta as mesas de RPG mecânicas, paradigmas e maneiras de se jogar dos primórdios do hobby. Bem, eu nunca joguei RPG durante estes primórdios e OSR para mim é o seguinte: mais uma novidade suculenta para devorar.

https://www.rederpg.com.br/wp/wp-content/uploads/2019/02/OSR-logo-418x195.png

Entre os vários, vários, jogos OSR, um deles me cativou e atraiu mais que todos, o DCC RPG. Bem, o que seria este DCC é qual sua diferença para outros sistemas? DCC quer dizer Dungeon Crawl Classics, ou, em tradução livre, “Clássicos de Exploração de Masmorras”.

Ou seja, ele procura emular aqueles tempos em que o jogo era apenas entrar em masmorras/ruínas/florestas amaldiçoadas, vencer monstros, adquirir riquezas e experiências e seguir para a próxima aventura. Infelizmente, ele falha nisto. Mas por que?

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Primeiro, que este jogo procura também evocar várias coisas ao mesmo tempo, tanto a tradição, quanto mecânicas mais modernas, assim como um estilo de jogo entre o grim dark e o gonzo. É essa mistureba que rende algo maravilhoso, uma homenagem, mas com uma experiência diferente do comum para o gênero.

As aventuras oficiais do DCC, por exemplo, possuem desde o mais comum no gênero, até laboratórios de viajantes do tempo abandonados em geleiras, ou pontes invisíveis que levam a buracos no céu. A maior parte delas vai ter algo inusitado e estranho, muitas vezes cômicos, assim como muitas ilustrações da arte interna do livro.

https://www.kickstarter.com/projects/1409961192/dcc-rpg-4th-printing

As mecânicas do jogo são baseadas nas mecânicas dos antigos jogos D20. O jogo se utiliza, por exemplo, de seis atributos: força, agilidade, vigor, personalidade, inteligência e sorte. Notem que os mesmos diferem levemente dos atributos do RPG mais famoso do mundo, como a mudança dos nomes de constituição e destreza para vigor e agilidade, assim como a exclusão de carisma e a introdução de sorte. O que não muda tanto assim os princípios de como eles são utilizados, apenas sorte que possui novas mecânicas.

Outra mecânica semelhante são as de Testes de Dificuldade, que possuem uma “Classe de Diculdade ou CD”, que servem como alvo para o sucesso ou falha da ação. O jogador rola os dados, geralmente um D20, soma com o bônus de atributo relevante e precisa tirar um número igual ou superior a CD do teste para obter sucesso, um número menor é uma falha.

Em relação aos combates, uma das mais queridas partes da sessão entre boa parte dos jogadores, se assemelha bastante a maior parte dos OSR derivados do D&D. Armas de corpo a corpo utilizam o bônus de força para as jogadas e dano, enquanto armas a distância utilizam agilidade. Para acertar o ataque, o número obtido deve ser igual ou maior que a CA (Classe de Armadura do oponente). Por ser um jogo OSR, a morte é bem mais próxima e a cura quase inexistente, seja por magias ou poções.

http://jabberwocky-media.com/?tag=dungeon-crawl-classics
Alguns personagens icônicos lutam contra homens bestiais

Comecemos então a falar de algumas mecânicas diferenciadas do DCC. Algumas delas existem em outros jogos, principalmente os OSR, como as raças como classes. Vejam bem, neste jogo, você não é um “Ladino Elfo”, você ou é elfo ou ladrão. Assim como os elfos, anões e halflings são classes em si só. De resto, temos as classes humanas, as clássicas guerreiro, ladrão, clérigo e mago.

Todas elas são bem interessantes e achei as mesmas bem melhores do que em outros jogos OSR. O elfo é um tipo de guerreiro que usa magias, o anão um guerreiro especializado em lutar com armas de uma mão e escudos (além de habilidades subterrâneas), o halfling é uma máquina de sorte que luta com duas armas, o ladrão possui habilidades ladinas realmente úteis e interessantes (depois do halfling, é a única classe que recupera sorte), o mago pode lançar magias arcanas (mas ao falhar, os resultados podem ser horrendos), assim como o clérigo lança magias divinas e pode sofrer com o desfavor dos deuses, se falhar em seguir seus mandamentos.

O guerreiro. Ah, o guerreiro de DCC, foi uma dádiva ter conhecido esta classe. Meus amigos, sempre gostei de jogar como guerreiro, mas as classes relacionadas a eles na maioria dos jogos é simplista e sem nenhuma graça. São quase todas iguais: podem usar todas as armas e armaduras, pontos de vida mais altos, bônus de ataque maior que as outras classes, talentos (e nem todo jogo possui esses últimos). Até então, os guerreiros de RPG sempre me lembraram aqueles bonecos de antigamente, que a gente apertava as pernas dos coitados e eles mexiam o braço pra cima e baixo segurando uma arma.

http://www.ultanya.com/2016/08/quest-hughs-weird-dice.html
Hugh Heftblade, Guerreiro icônico de DCC

Até que então, um dia, eu li sobre a classe Guerreiro no livro digital e foi paixão a primeira vista. Ela era útil, interessante e criativa. Apenas a mecânica de Feitos de Combate a distancia de qualquer classe de guerreiros de RPGs de fantasia que já tenha visto. Eu realmente vi meus jogadores sendo importantes para as cenas, principalmente por um motivo, o foda de série “Feitos de Combate”. Bem, o que seriam estes feitos? O jogador rola 1D3 (depois irei falar sobre os Dados Estranhos), que servirão como seu bônus de ataque. Isto mesmo, o bônus de ataque do guerreiro é fluído dentro desta jogada (em níveis mais altos o dado passa para D5 e D7), mas o mais interessante é que, com um resultado 3 ou maior, o guerreiro pode utilizar um feito de combate.

Bem, para utilizar o feito, antes o jogador deve acertar o oponente, como já explicado, mas se ele acertar… as coisas ficam muito interessantes, pois o feito de combate nada mais é do que uma ação de combate quase que livre, impedidas apenas pela criatividade do jogador, bom senso e a boa vontade do mestre. Que tal cegar um oponente com sua rapiera, ou derrubar aquele orc com sua lança? Já imaginou seu guerreiro se pendurar em uma cortina ou candelabro enquanto ataca aquele oponente alado? Correr pela parede e atacar o oponente por trás, deixando-o sem defesa? E se seu guerreiro for um arqueiro e acertar dois oponentes, que estavam um atrás do outro, de uma vez? Prender a capa do nobre fujão com uma flecha certeira? Desacordar o alvo do sequestro sem feri-lo. Decepar o braço da espada daquele cavaleiro negro que estava dando tanto trabalho? Entre tantos e tantos outros.

Sou completamente apaixonado por esta mecânica, irei adaptá-la para todos os guerreiros de qualquer sistema que jogarei na vida.

Mas, que tal agora falarmos sobre outras mecânicas legais do DCC?

Comecemos pela Cadeia de dados. Tanto ela é uma regra fixa, como nos dados de ação que vão aumentando com os níveis, como pode servir para se dar Vantagem ou Desvantagem em uma ação. Como assim? Imaginemos que o Huh Heftblade irá atacar um soldado mercenário de cima do balcão do bar. com um machado de duas mãos e que seu oponente está enroscado em uma cadeira e sem armadura alguma. O mestre então decide que isso seria muito mais fácil que o normal, então deixa que o jogador role 1d24 ao invés de 1d20, facilitando o seu sucesso.

https://weirdrealms.com/products/approved-for-dungeon-crawl-classics-7-dice-black
Dados Estranhos para DCC RPG

O que nos leva a outro detalhe interessante do jogo, os Dados Estranhos. São dados de RPG aparentemente comuns, mas com uma numeração bem diferente do que estamos acostumados. D3, D5, D7, D14, D16, D24 e D30 são suas numerações, e além de serem usados na Cadeia de Dados, algumas tabelas e regras os utilizam.

A magia em DCC lembra as de outros jogos OSR, mas possui várias características legais de outros jogos em seu sistema de conjuração, tornando-o muito divertido. Começando pela jogada de magia, que é bem simples: 1d20+Modificador de Inteligência+Nível do Conjurador. Ao obter o resultado, comparamos o mesmo na tabela da magia e, dependendo do que vermos lá, sua magia pode ter falhado, saído mais fraca ou até mais forte do que o esperado. Por experiência própria, isso pode render várias risadas.

Também existe a Queimarcana, onde o mago sacrifica pontos de seus atributos físicos para poder aumentar sua pontuação para a jogada de conjuração. A Magia Mercurial, que concede efeitos únicos as magias de cada mago, de apenas chatos a perigosos para o conjurador e seus companheiros ou benéficas para os mesmo e desastrosas para os oponentes.

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Corrupções

Existem também as corrupções, que variam de menores a maiores. Quanto mais o conjurador tirar 1 no dado ao tentar conjurar magias, ele recebe corrupções, que são deformidades e outras características repugnantes que deformam o mago por procurar poder e falhar. Semelhante a isto, os clérigos ao falharem da mesma maneira tem que cumprir penitências para reaver o favor dos deuses.

Para o final, deixei a mecânica que achei mais interessante e divertida do jogo, o Funil. Nesta modalidade de jogo, cada jogador começa com quatro ou cinco personagens, com profissões roladas aleatoriamente em uma tabela. Temos de nobre e coletor de excremento a advogado élfico, halfling luveiro e anão boticário. O jogador pode utilizar os conhecimentos que sua profissão concederiam ao mesmo, ganhando de bônus a um dado maior na cadeia de dados. Mas e esse monte de gente? A aventura funil é feita para que os personagens mais fracos ou azarados vão morrendo e que, idealmente, cada jogador acabe com um personagem, para que estes então passem ao primeiro nível e se forme o mais novo grupo de aventureiros.

https://delibriand.wordpress.com/2016/09/30/funnel-world-resenha/
Pessoas comuns enfrentando um esqueleto em um Funil

Creio que chegamos ao fim, queria apenas reforçar como este jogo é divertido, que apesar do livro imenso eu consegui jogar várias aventuras com um grupo de iniciantes. Lá na gringa os jogadores de DCC tem acesso a vários suplementos e eventos especiais, que espero começarmos a ter aqui no Brasil, com a Sagen agora com os direitos do jogo em nosso país.

https://goodman-games.com/dungeon-crawl-classics-rpg/
Várias capas do DCC, além de uma capa para o Mutant Crawl Classics, a versão sci-fi para este jogo lindo

 

2 comentários em “DCC RPG, um jogo que usa o passado para a diversão como nenhum outro

  1. Eu amei demais, sério, já quero tentar jogar usando esse sistema (vou até mostrar sua postagem pra alguns amigos). As corrupções definitivamente foram uma das coisas que mais me chamou a atenção.
    Mal posso esperar pra jogar c:

    Curtido por 1 pessoa

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